1º Domingo do Advento - Comentários bíblicos - Bispo D. Fernando Soares - 28/11/2021

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COMENTÁRIO BÍBLICO 
1º Domingo do Advento– Ano C
28nov2021

Jeremias 33, 14-16; Salmo 25, 1-10; I Tessalonicenses 3, 9-13
 
S. Lucas 21, 25-36
25E disse mais: «Haverá sinais no Sol, na Lua e nas estrelas, e todas as nações da Terra ficarão aflitas e assustadas com o terrível bramido do mar agitado. 26Haverá quem desfaleça com medo do que vai acontecer em toda a Terra, porque as forças do espaço serão abaladas. 27Verão então o Filho do Homem chegar numa nuvem com grande poder e glória. 28Quando estas coisas começarem a acontecer, animem-se e levantem a cabeça porque já estará próxima a vossa salvação.»
29Jesus apresentou-lhes depois outra parábola: «Reparem na figueira e em todas as outras árvores. 30Quando as suas folhas começam a aparecer, vê-se logo que o verão se aproxima. 31Do mesmo modo, quando virem acontecer estas coisas, fiquem sabendo que o reino de Deus está perto. 32Garanto-vos que tudo isso há-de acontecer antes de desaparecer a gente deste tempo. 33Desaparecerão os Céus e a Terra, mas as minhas palavras não desaparecem!»
34«Tenham muito cuidado! Não se deixem cair nos exageros do comer e do beber, nem se deixem absorver pelos muitos cuidados desta vida! Não vá acontecer que aquele dia vos apanhe de surpresa, 35pois ele virá como uma armadilha, sobre todos os habitantes da Terra. 36Estejam bem atentos e peçam sempre a Deus para que possam escapar a todas estas coisas que vão acontecer e para que possam apresentar-se firmes diante do Filho do Homem.»

1. Neste domingo iniciamos mais um Ano Litúrgico. Mais do que uma sucessão organizada de acontecimentos, festas e solenidades, o Ano Litúrgico, em cada estação, em cada tempo, lembra-nos quanto o Mistério de Cristo ilumina a nossa história de vida e introduz-nos na ambiência em que Deus se faz presente e atua segundo e à medida do Seu amor. 
A primeira estação é a do Advento. Na perspetiva da fé, além da dimensão histórica da salvação, há sempre um tempo a vir. É esse o significado do Advento. Jesus que, ao encarnar, manifesta a presença salvífica de Deus atuando na história humana e torna próximo o Reino (S. Marcos 1, 15), mas que também nos chama a atenção para a consumação da salvação que se cumprirá no "dia do Senhor", no final dos tempos. Ou seja, um tempo em que somos alertados para a relação entre as duas perspetivas existenciais em que se desenvolve a nossa vida: a dimensão do aqui e agora e a do tempo que “há-de vir” (Jeremias 33, 14), a dimensão escatológica do mistério cristão.
Assim, podemos dizer que o Advento se apresenta como a súmula do plano de libertação (salvação) da humanidade no qual presente e futuro se interpenetram. Então, estas quatro semanas ganham relevo na nossa caminhada de fé. Devem ser encaradas como um tempo propício à oração e conversão, em que nos questionemos sobre a vivência da pobreza, à luz do ensino de Jesus, que leva a confiar e depender inteiramente de Deus e não dos bens terrenos.

2. No Evangelho de hoje Jesus chama a nossa atenção para acontecimentos cósmicos que nos arrepiam. E o certo é que alguns deles, juntos com guerras, calamidades e outras situações criadas pelo desabrido desejo humano de domínio e riqueza, já se manifestam e causam-nos medo e ansiedade. Mas Jesus diz-nos também: Quando estas coisas começarem a acontecer, animem-se e levantem a cabeça porque já estará próxima a vossa salvação”. Ou seja, o que Jesus declara não é uma ameaça, antes, é uma promessa de esperança: o anúncio da chegada do Reino de Deus como uma libertação. Não se sabe o que será essa libertação: será a vinda do Filho do Homem iminente e retumbante, como a pensava a Igreja primitiva? Ou trata-se dum processo histórico que se irá desenvolvendo, como um processo de crescente libertação, ao longo dos tempos? Contudo, perspetiva-se como um acontecimento alegre e de festa: a passagem da opressão para a liberdade. Assim, a esperança que Jesus nos promete tem de ser assimilada e vivida como um caminho de crescimento humano e espiritual, um caminho de amadurecimento que nos faz crescer e prepara para a liberdade quando o Senhor da história a quiser manifestar.

3. A espera em tempo de pandemia é sacrificial. Começa a ser um “esperar contra a esperança” (Romanos 4, 18). Embora a vacinação trouxesse uma elevada sensação de segurança percebeu-se rapidamente que não obstava a que os vacinados fossem contaminados e, por tal, agentes de contaminação. Ou seja, mesmo vacinados continuava-se com o cheiro da pandemia a afetar as nossas pituitárias mentais. Entretanto, à medida que avançámos para o tempo mais frio fomos noticiados de que era preciso uma terceira dose, para reforçar o desgaste imunológico que já se começava a descobrir em pessoas mais idosas. É o estado em que estamos hoje. Quer dizer, parece que a pandemia veio para ficar, o que alonga a espera pela sua erradicação. Se nalguma coisa a pandemia nos está a marcar é na necessidade de aprendermos a viver na incerteza. Por este tempo são em excesso as mudanças, as alterações em acontecimentos e, também, a instabilidade dos desenvolvimentos com a pandemia. E há pessoas que não se conseguem estruturar para que cada um dos seus dias seja melhor do que o anterior. Então, nesta conjuntura como exercitar a esperança?
Jesus diz-nos “Tende cuidado convosco para que os vossos corações não se tornem pesados na ressaca, na embriaguez e nas preocupações da vida” (Bíblia, de Frederico Lourenço). Ter coração pesado significa a possibilidade de incapacitar a mente para ver e compreender o que realmente ocorre ao nosso redor na vida, no mundo, na sociedade e na Igreja. Porque nada influencia tanto a mente como os afetos e sentimentos que ocupam e carregam o coração. Ora, o que carrega a mente e o coração é a atitude, a opção fundamental, de quem só pensa em si, no seu próprio bem-estar e em disfrutar a vida dos prazeres e do dinheiro. E sabe-se bem quanto isso nos incapacita para vermos por dentro e para ver o que realmente nos convém. Nessa situação não compreenderemos que Advento não é espera acomodada, mas movimento para diante, vontade de encontro com Cristo que“é a nossa esperança” (I Timóteo 1, 1). Esperemos nEle a libertação das nossas fraquezas, de modo a que aprendamos a ter paciência diante das dificuldades e tribulações da vida, indo ao encontro dos que precisam da nossa palavra, do nosso abraço ou da nossa ajuda. Assim, ganharemos em humildade e mansidão e perceberemos o verdadeiro significado da vida no Reino, agora e no futuro.

+ Fernando
Bispo Emérito da Igreja Lusitana

 
 

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