2º Domingo depois do Natal - Comentários bíblicos - Bispo D. Fernando Soares - 2/1/2022

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COMENTÁRIO BÍBLICO 
2º Domingo depois do Natal– Ano C
2jan2022


Jeremias 31, 7-14; Salmo 147, 12-20; Efésios 1,1-6.15-18
 
S. João 1,1-18
1No princípio era a Palavra. A Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus.
2Aquele que é a Palavra estava no princípio com Deus.
3Todas as coisas foram feitas por meio dele, e sem ele nada foi criado.
4Nele estava a vida, vida que era a luz dos homens.
5A luz brilha nas trevas, trevas que a não venceram.
6Houve um homem enviado por Deus que se chamava João.
7Ele veio para dar testemunho, para dar testemunho da luz, para que todos cressem por meio dele. 8João não era a luz, mas foi enviado para dar testemunho da luz.
9Aquele que é a Palavra era a luz verdadeira; Ele ilumina toda a gente ao vir a este mundo.
10Ele estava no mundo, mundo que foi feito por ele. O mundo não o conheceu. 11Ele veio para o seu próprio povo e o seu povo não o recebeu. 12Mas a todos quantos o receberam, aos que creem nele, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. 13Estes não nasceram de laços de sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas nasceram de Deus.
14A Palavra fez-se homem e veio habitar no meio de nós, e nós contemplámos a sua glória, como glória do Filho único do Pai, cheio de graça e de verdade.
15João deu testemunho dele ao proclamar: «Era deste que eu dizia: Aquele que vem depois de mim é mais importante do que eu, porque já existia antes de mim.» 
16Todos nós participámos da abundância dos seus bens divinos e recebemos continuamente as suas bênçãos. 17É que a lei foi-nos dada por intermédio de Moisés, mas a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo. 
18Nunca ninguém viu Deus. Só o Deus único, que está no seio do Pai, o deu a conhecer.

1. O Evangelho de hoje é conhecido por “Prólogo do Evangelho segundo S. João”. De forma completamente distinta dos Evangelhos Sinóticos (S. Mateus, S. Marcos e S. Lucas), o de S. João inicia-se com o que parece um hino porventura em vigor na Igreja do primeiro século da nossa era. Tem um ritmo próprio e resume o que vai tratar-se na narrativa que se lhe segue. O centro do Evangelho é Jesus Cristo. Começa por chamar-Lhe a “Palavra” que era no “princípio”, que incarnou (fez-se pessoa humana) e tornou-se a “imagem” de Deus entre os homens. Isto é, Deus, a transcendência, em Jesus, humanizou-se, fez-se presente, visível e tangível num ser humano. Assim nos ‘fala’ o último versículo do Prólogo: “Nunca ninguém viu Deus. Só o Deus único, que está no seio do Pai, o deu a conhecer.”
Em suma, só em Jesus, na Sua forma de vida, nos Seus gestos, nas Suas palavras é que aprendemos o que podemos saber sobre Deus, e como podemos encontrar Deus.

2. Por isso, naquele Prólogo se afirma com simplicidade e clareza que em Jesus estava a vida, a luz, a verdade, o necessário para que conhecer a Deus. Mais enfaticamente, a revelação, até então decorrente da Lei mosaica, veio aos homens por Cristo: “a lei foi-nos dada por intermédio de Moisés, mas a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo.” E se há alguma coisa que Jesus, na Sua verdade, nos ensinou também, com simplicidade e clareza, foi que a “Palavra” não é só discurso, passa fundamentalmente pela relação. Assim como um falar ‘para’ e um dizer ‘com’. Por isso, o Seu mandamento: “amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (S. João 15, 12 e 17). E só se pode amar na relação de uns com os outros. Só em tal relação presencial (não apenas a ‘digital’ e a escrita) em que os olhares se cruzam, os abraços aproximam, os beijos acarinham, o perdão surge, a palavra e o gesto sinceros ocorrem, a ajuda e a dádiva acontecem, a alegria se transmite, o sofrimento se apazigua, numa palavra, o contexto da vida humana onde refulgem a luz, a verdade e a vida de Jesus. E, assim, como na experiência de vida dos primeiros cristãos, se descobre Deus. Porque “Deus é amor” (I João 4, 11-16).

3. Tudo isto para ter em conta nos desejos para o Novo Ano. O “novo” é algo que nos atrai e que nos influencia de modo extraordinário. Até a Bíblia o refere na visão de um novo céu e uma nova terra no Livro do Apocalipse, em que se ouvem as palavras atribuídas a Jesus: “eis que faço novas todas as coisas”(Apocalipse 21, 5). Realmente no cerne do cristianismo está a esperança. É a ‘espera’, quando assumida na dinâmica da sua condição, que nos arrebita e nos distingue daqueles para quem a festa é passageira, ‘coisa’ do presente. Sabemos que Jesus veio para fazer tudo novo, para trazer uma nova visão ao ser humano, um novo projeto para a sua vida.
Então, ao entrar num Novo Ano importa que nos questionemos se queremos mesmo que o que agora iniciamos seja mesmo “novo”. Para os que sofreram em 2021 certamente que o desejo é que o ano de 2022 seja diferente, para melhor. É compreensivo. Mas, para os que estiveram ‘bem’  o desejo é o da continuidade. Afinal, todos queremos ser felizes, ter saúde e que tudo nos corra bem. Porém, precisamos de um espírito crítico para analisar a realidade de que somos parte. A vida depende de um manancial de circunstâncias que acontecem à revelia da nossa vontade e, por isso, muitas vezes nos surpreendemos com o que nos calha, com o que temos de enfrentar na sua roda. Como exemplo, tenhamos em conta o que tem acontecido com tanta gente desde o aparecimento da pandemia do COVID.
Se estamos conscientes de que em Deus “vivemos, nos movemos e existimos”, como diziam os antigos (Atos 17, 28), então, entremos em 2022 com a confiança de que, o que quer que aconteça, Jesus, o nosso amigo e Salvador, se fará presente no nosso coração com a Sua esperança (S.H. 426):  

Uma âncora temos,
Que a força do mar,
Por muito que ruja,
Não pode quebrar.

É a linda esperança
Que outorga Jesus,
Legada na morte
De angústia na cruz.

+ Fernando
Bispo Emérito da Igreja Lusitana
 

 
 
 

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