Homilia Vigília Pascal 2017

D. Jorge Pina Cabral – Igreja Lusitana

 

«Aleluia! Cristo Ressuscitou!

Na verdade ressuscitou! Aleluia!»

E agora?

Será que chegamos ao fim da festa, e de uma festa que por sinal teve um final feliz dado que o amor venceu o pecado, os maus foram derrotados e a própria morte foi vencida, como muito bem expressamos quando usando as palavras de S. Paulo questionamos: «ó morte, onde está o teu aguilhão, onde está o teu poder de matar?» (1 Coríntios 15,55)

Será que este é o «happy-end» de um conjunto de festividades que uma vez mais procuramos cumprir com rigor e seriedade? Tudo se iniciou há quarenta dias atrás com a solene celebração de 4ª feira de cinzas. Tudo desde então, procuramos realizar a preceito, e fomos desse modo vivendo o tempo quaresmal, a semana santa e o tríduo pascal que tem o seu clímax nesta celebração da Vigília Pascal. Depois do jejum, da abstinência, da renúncia, e em contraponto à paixão, ao sacrifício e à morte, agora, hoje e aqui, estamos a celebrar a Vida e a fazer Festa. Ficamos sempre mais confortados, é uma história que quer queiramos ou não tem sempre um final feliz, que é o da Ressurreição de Jesus. Um final feliz e vitorioso para o qual pouco contribuímos apesar de tudo ter começado com o nosso pecado, a nossa traição e o nosso abandono de Jesus Cristo. Apesar da nossa culpa individual e coletiva, que despoletou a Paixão e a Morte de Jesus, apesar de tudo isso, tudo termina bem graças ao grande Amor e Misericórdia de Deus.

A Páscoa está pois cumprida, e as nossas tradições pessoais, familiares e eclesiais bem realizadas também e (pensamos nós …) são garante de um futuro feliz. Podemos então voltar à nossa vida normal após o «sobressalto» da quaresma e da Páscoa, voltaremos até, iremos dizer nós liturgicamente e lá mais para a frente, ao «tempo comum».

Então e agora?

Verdadeiramente neste tempo de Páscoa que hoje se inicia, o questionamento e o refletir não nos levam a olhar para trás, como quem já cumpriu o que tinha de ser feito, celebrou o que havia a celebrar, mas antes levam-nos a olhar para a frente, como quem se abre agora a um novo caminho que se nos oferece.

A este propósito, na carta pascal enviada aos bispos anglicanos em todo o mundo, o sr Arcebispo de Cantuária, Justin Welby, cita S. Leão Magno, quando este padre da Igreja, num sermão no dia de Páscoa, exortou a sua congregação a «não confinar os seus pensamentos da Esperança Pascal à festa da Páscoa mas antes à santificação de toda a vida». Ou seja, verdadeiramente o que se nos oferece nesta Páscoa, em mais uma Páscoa (!), é a possibilidade de agora percorrermos um caminho novo, um caminho de discipulado intencional, de homens e mulheres livres na sua opção por Jesus Cristo e comprometidos na sua missão de fazer novos discípulos e de «batizar as pessoas em nome do Pai, do Filho e do Espirito Santo, ensinando-as a obedecer a tudo o que Jesus nos ensinou». (Mateus 28, 19-20)

A particularidade da Páscoa, é então, a de orientar a nossa vida, o nosso pensamento, o nosso querer, todo o nosso ser, para o futuro novo que a ressurreição de Jesus nos oferece enquanto seus discípulos; homens e mulheres que pela graça de Deus, acolheram já nas suas vidas através do Batismo, o Espirito de Cristo ressuscitado.

Páscoa não é pois um «happy-end» que uma vez mais se nos oferece, mas antes o inicio ou se quisermos o reinicio de um novo tempo, de uma nova oportunidade, na linguagem bíblica Paulina o tempo de uma nova criação que tem em Jesus ressuscitado o seu primogénito.

A pergunta que inicialmente colocamos: «e agora ?» deve começar a dar lugar  a uma outra … que poderá ser  «e agora como fazer para celebrarmos a Páscoa num caminho de santificação de vida ?»

A resposta percebemos, encontra-se no modo como assumirmos ou não a nossa condição de discípulos do Senhor Ressuscitado e de vivermos a Igreja como muito bem foi dito como uma «comunidade de discípulos que faz discípulos e glorifica a Deus». 

Como assumirmos então e cada vez mais e de um modo comprometido a nossa condição de discípulos, de homens e mulheres livres na sua opção por Jesus Cristo? (e que por isso estão hoje aqui nesta noite a celebrar a Vigília Pascal)

A resposta, como não poderia deixar de ser, está uma vez mais em Jesus Cristo e no modo como assumirmos na nossa vida, o sentido da obediência, da entrega e do despojamento que Cristo assumiu tão bem na sua vida terrena e que O levou da última ceia até ao Domingo da ressurreição.  

O alimento de Jesus (como vimos neste dias que nos precederam) foi o de fazer a vontade do Pai. Cristo foi obediente até à morte e morte de cruz. Nesta obediência e total dependência de Deus, Jesus encontrou ai a Sua força, a Sua alegria e a Sua liberdade. Nesta obediência e dependência de Deus, Jesus Cristo encontra o seu verdadeiro ser e o sentido da sua missão. Ele próprio no-lo afirma quando em João 8, 28 nos diz : «Quando tiverdes levantado o Filho do homem, então sabereis que Eu sou, e que não faço nada por Mim mesmo, mas como o Pai Me ensinou, assim faço». «Eu sou» porque «nada faço por mim mesmo». O ser de Cristo radica-se na Sua submissão ao Pai. Ele «é» porque «obedece». «Pai, se for do teu agrado, livra-me deste cálice de amargura. No entanto, não se faça a minha vontade, mas sim a tua». (Lucas 22,42). Ele «é» porque obedece ao Pai, e nós «seremos verdadeiramente», na medida em que como Ele também nós obedecermos ao Pai.

Então queridos irmãos, viver agora o Tempo de Páscoa que se nos oferece até ao Pentecostes, requer esta imitação do exemplo do Senhor Jesus, e este apropriar da sua vida. Requer a humildade da obediência à vontade de Deus, e requer dependência de Deus naquilo que Ele no Seu Amor nos tem para oferecer.

Obediência e dependência, duas atitudes, dois modos de estar e de ser, que chocam com a cultura e o entendimento do nosso tempo e talvez aqui quem sabe, a dificuldade em hoje nos assumirmos como discípulos de Jesus; por um lado ninguém quer obedecer a ninguém, por outro, ninguém quer estar dependente de ninguém. E no entanto, obedecer a Deus, e estar dependente de Deus, não nos priva do que somos nem nos priva da nossa liberdade, antes potencia o que podemos vir a ser e aprofunda a própria vivência da liberdade no exercício responsável da nossa vocação e daquilo que nos é confiado.   E verdadeiramente irmãos, nós somos livres em Cristo, porquê o que hoje aqui celebramos, nesta Vigília Pascal, é a realidade do sacrifício redentor de Cristo, nos ter libertado do poder do pecado…. «ó morte, onde está o teu aguilhão?»

Neste Tempo de Páscoa que agora se inicia, o «happy-end» dá lugar a um tempo de discipulado, em que devemos proclamar a Cristo, e revestirmo-nos d’Ele, isto é vivê-lo. Proclamar e viver o homem novo com o testemunho credível da nossa vida.  Mas sabendo sempre, queridos irmãos, que a novidade do homem novo, mede-se pela Sua obediência e conformidade à vontade de Deus na sua vida.

Na mensagem pascal, o Sr. Arcebispo de Cantuária convida os cristãos, uma vez mais, a juntarem-se a ele na oração do «Venha o Teu Reino» no período entre o dia da Ascensão (25 de Maio) e o dia de Pentecostes (4 de Junho). É um tempo novo que visa o aprofundamento da vivência da Oração e da prática da Evangelização à luz do que fizeram os primeiros cristãos conforme nos é apresentado nos primeiros capítulos do livro dos Actos dos Apóstolos. É um tempo novo que requer discípulos de Cristo Ressuscitado, um discipulado intencional e uma Igreja «comunidade de discípulos, capaz de fazer discípulos e glorificar a Deus».

«Venha o Teu Reino» é um movimento ecuménico e internacional que convida os cristãos em todo o mundo a juntarem-se em Oração com o objetivo de dar a conhecer Jesus Cristo. Na sua última reunião a Comissão Permanente da Igreja Lusitana decidiu aceitar este convite e promover iniciativas que visem o aprofundamento da vivência da Oração e da prática da Evangelização, procurando que entre outras, esta seja também uma via de concretização do tema Sinodal na vida da Igreja, das paróquias, das famílias e das pessoas.

Eis pois e desde já, uma vivência de Oração e de Evangelização a que somos chamados no testemunho do poder transformador da ressurreição de Cristo na nossa vida e na vida dos outros. Aquilo que aparentemente hoje terminava, aparece-nos desde já como um tempo novo, o início de um novo caminho com Cristo, em Cristo e por Cristo ressuscitado.

«Aleluia! Cristo Ressuscitou! Na verdade ressuscitou! Aleluia!»

Santo Tempo de Páscoa

Paróquia Lusitana do Bom Pastor, Vila Nova de Gaia, 15 de Abril de 2017

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