3º Domingo Comum - Comentários bíblicos - Bispo D. Fernando Soares - 23/1/2022

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COMENTÁRIO BÍBLICO 
3º Domingo Comum – Ano C
23jan2022

Neemias 8,1-4a.5-10; Salmo 19,7-14; 1 Coríntios 12,12-31
 
S. Lucas 4,14-21

14Jesus voltou para a Galileia conduzido pelo Espírito Santo. A sua fama espalhou-se por toda aquela região. 15Ensinava nas sinagogas e todos o elogiavam.
16Foi em seguida para Nazaré, a terra onde se tinha criado. No sábado foi à sinagoga, como era seu costume, e pôs-se de pé para ler as Escrituras. 17Deram-lhe o livro do profeta Isaías. Ele abriu-o e encontrou o lugar onde estava escrito assim:
18«O Espírito do Senhor tomou posse de mim, por isso me escolheu para levar a boa nova aos pobres. Enviou-me para anunciar a libertação aos prisioneiros, para dar vista aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos 19e para proclamar o tempo favorável da parte do Senhor
20Depois Jesus fechou o livro, devolveu-o ao encarregado e sentou-se. Ficaram todos com os olhos fixos nele. 21Jesus começou então a dizer-lhes: «Esta parte da Escritura que acabaram de ouvir cumpriu-se hoje mesmo.»
 
1. O Evangelho de hoje surge-nos como uma página inaugural de algo de novo a acontecer: o sentido e a substância da pregação de Jesus. Numa palavra, o Seu Plano Messiânico. Não é um mero projeto a realizar nem uma narrativa poética com uma mensagem de consolação. É, isso sim, a expressão da vontade de Deus em querer estabelecer uma aliança eterna com o Povo de Israel (Isaías 61, 1-2). É, portanto, uma palavra e um desígnio que vêm de longe. Jesus, ao ler na sinagoga aquela palavra do Profeta Isaías, apresenta-se como o Messias que Israel esperava e que agora aconteceu: Esta parte da Escritura que acabaram de ouvir cumpriu-se hoje mesmo”. Como se pode ainda duvidar que Jesus veio para trazer o Evangelho aos ‘pobres’ (curar os de coração ferido – conforme a versão dos LXX), anunciar a libertação aos prisioneiros, dar vista aos cegos e libertar os oprimidos, e proclamar o tempo da misericórdia divina?
Quando temos presente a resposta de Jesus ao jovem rico que seguia todos os mandamentos e queria saber o que devia fazer para ganhar a vida eterna: “Vai vende tudo o que tens e dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu. Depois, vem e segue-me” (S. Marcos 10, 17-22); o elogio à pobre viúva que colocou duas pequenas moedas no gazofilácio do tesouro do Templo, pois, “ na sua pobreza depositou tudo o que tinha, tudo o que possuía para viver” (S. Lucas 21. 2-4); ainda, a resposta de Jesus aos discípulos de João que O procuraram para saber quem era: “aos pobres é anunciada a Boa Nova”;percebemos que a preferência e “o zelo para com os pobres é uma das prioridades dos primeiros cristãos recebida de Jesus”[i].

2. Temos de ser sinceros. Aquela resposta de Jesus ao jovem rico soa aos nossos ouvidos como uma nota dissonante “Vai vende tudo o que tens e dá o dinheiro aos pobres“. E já nem lemos o resto da frase. Sabemos bem da nossa tendência para nos apegarmos ao que temos, pouco ou muito, e o medo que nos assalta quando nos desfazemos dos nossos bens, mesmo que insignificantes. Por outro lado, é geral a nossa tendência para estar do lado dos ricos seja a sua riqueza de natureza material, cultural ou espiritual. Isto é, “temos medo de nos convertermos e de acreditar no Evangelho”.[ii]Ora, a preferência pelos pobres, na diversidade das suas necessidades, impõe-nos que aceitemos o convite de Jesus para reavaliarmos o valor que damos ao que tanto estimamos e desejamos, colocando-nos inteiramente nas mãos de Deus, criador e Pai. Só assim, dispostos a confiar totalmente em Jesus e na Sua palavra poderemos libertar-nos de outros pesos que nos oprimem para ajudarmos os que precisam com humildade e misericórdia. É o que sobressai da atitude da viúva pobre ao colocar no tesouro “tudo o que tinha, todo o seu sustento”.
Então, este Evangelho cumpre-se hoje mesmo. Aquelas palavras lidas por Jesus na sinagoga conservam uma permanente atualidade, podendo ser aplicadas aos dias de hoje e praticadas no presente. Precisamos de ser persistentes pedindo a Deus a Sua força e a graça do Espírito Santo para nos convertermos a Jesus, Senhor e Salvador, e acreditar no Evangelho a fim de nos libertarmos das escravidões da nossa vida e ficarmos livres para ser testemunhas do amor de Deus no mundo.

3. Está a decorrer a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos cujos tema e textos preliminares, este ano, foram preparados pelo Conselho das Igrejas do Médio Oriente, com sede em Beirute, no Líbano. Escolheram para tema “Vimos a sua estrela no Oriente e viemos honrá-lo” (Mat. 2,2), glosando o episódio dos Magos. O texto de Introdução ao Tema começa:
“De acordo com o Evangelho de Mateus (2: 1-12), o aparecimento da estrela no céu da Judeia representa um sinal de esperança há muito aguardado e que leva os magos, e na verdade todos os povos da terra, ao lugar onde o verdadeiro rei e Salvador é revelado. Esta estrela é um dom, uma indicação da presença amorosa de Deus para toda a humanidade. Para os magos, foi um sinal de que um rei tinha nascido. Com os seus raios de luz, ela conduz a humanidade para uma luz maior, Jesus, a nova luz que ilumina cada pessoa e que nos conduz à glória do Pai e ao esplendor que ela irradia”. 
E termina:
“Depois de encontrar o Salvador e adorá-lo juntos, os magos voltaram aos seus países por um caminho diferente, tendo sido avisados num sonho. (…) Viajar por novos caminhos é um convite ao arrependimento e renovação das nossas vidas pessoais, das nossas igrejas e das nossas sociedades. (…) Servir o Evangelho hoje requer o compromisso de defender a dignidade humana, especialmente doa mais pobres, dos mais fracos e marginalizados. Exige das igrejas transparência e responsabilidade no trato com o mundo e umas com as outras. Isso significa que as igrejas precisam cooperar para fornecer alívio aos aflitos, acolher os deslocados, aliviar os sobrecarregados e construir uma sociedade justa e honesta. (…) O novo caminho entre as igrejas é o caminho da unidade visível que buscamos sacrificialmente com coragem e audácia para que, dia a pós dia, ‘Deus seja tudo em todos’ (I Cor 15, 28)”.

+ Fernando
Bispo Emérito da Igreja Lusitana


[i] James D. G. Dunn, “Jesus segundo o Novo Testamento”, PAULUS Editora, 2021, pg.19
[ii] Carlo Maria Martini, “Tomados de Assombro”, Paulinas Editora, 2013, pg. 59
 
 
 

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